Criada em 06/06/2023 às 12h11 | Pesquisa

Pesquisa mostra que cultura do trigo absorve mais CO2 do que emite

Pesquisa conduzida pela Embrapa e a Universidade Federal de Santa Maria comprovou que o trigo tem potencial “descarbonizante”, ou seja, retém mais quantidade de carbono no solo do que a que emite para a atmosfera.

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Os cientistas observaram que durante o ciclo produtivo, o trigo absorveu dióxido de carbono, neutralizando as emissões dos períodos de pousio. (Foto: José Henrique Chagas)

Pesquisa conduzida pela Embrapa Trigo (RS) e a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) comprovou que o trigo é capaz de sequestrar mais carbono do que emite para a atmosfera. Os cientistas observaram que durante o ciclo produtivo, o trigo absorveu um total de 7.540 kg de dióxido de carbono (CO2) por hectare da atmosfera, neutralizando as emissões dos períodos de pousio (sem plantas de cobertura do solo ou cultura geradora de renda sob a forma de forragem ou produção de grãos), e garantindo a oferta líquida de 1.850 kg de CO2 por hectare. Os resultados deram origem ao artigo CO2 flux in a wheat/soybean succession in subtropical Brazil: a carbon sink, que pode ser acessado aqui.

A pesquisa contou com a instalação de uma torre de fluxo, em uma lavoura de grãos, em Carazinho, município na região norte do Rio Grande do Sul. Esse equipamento é utilizado pela UFSM para avaliar a emissão de gases de efeito estufa (GEE) desde a década de 1990. O objetivo foi avaliar as diferenças entre emissão e retenção de carbono (balanço) no sistema de produção trigo-soja, quantificando os fluxos de CO2 em lavoura comercial de grãos. Utilizando o método de Covariância de Fluxos Turbulentos ou Eddy Covariance (EC), a torre de fluxo capturou informações capazes de identificar o balanço de carbono em cada etapa do sistema de produção ao longo do ano. A pesquisa envolveu dez profissionais de diferentes segmentos, como engenheiros-agrônomos, físicos, matemáticos e profissionais da ciência da computação.

De acordo com a professora Débora Roberti, do departamento de Física da UFSM, apesar do equipamento apresentar alto custo para aquisição (que pode chegar a 180 mil dólares), ele permite uma resposta rápida sobre os fluxos de gases no sistema, gerando uma sólida base de dados em apenas um ano, enquanto outras técnicas de campo demandam longos períodos de tempo para uma resposta segura em relação ao balanço de carbono no ambiente. “O método que utilizamos ajudou a estabelecer parâmetros para orientar o manejo mais eficiente das áreas agrícolas na retenção de carbono em prol de um sistema de produção de grãos mais sustentável”, explica a pesquisadora, lembrando que as informações geradas podem chegar ao produtor de forma prática, ajudando na tomada de decisão: “Traduzimos uma série de algoritmos numa linguagem simples, acessível ao produtor e à assistência técnica, para que os conhecimentos possam ser adotados na lavoura”, acrescenta.

Contexto do Sistema

Depois do Centro-Oeste, a Região Sul é o segundo grande polo de produção de grãos no Brasil. Os três estados do Sul (PR, SC e RS) respondem por mais de 90% da produção de trigo e por 30% da produção nacional de soja. Pela valorização da soja no mercado, os cultivos de inverno nem sempre compõem o cenário agrícola, restando muitas áreas em pousio nos meses de outono e inverno.

Na Região Sul, conforme dados da Conab, atualmente são contabilizados mais de 15,2 milhões de hectares com culturas de verão (soja, milho 1ª safra e silagem, arroz e feijão), e apenas 5,8 milhões de hectares com cultivos de inverno (trigo, milho 2ª safra, aveia, cevada, triticale, centeio e canola). Outros 3 milhões de hectares constituem-se em sistemas de integração lavoura-pecuária (ILP), que contam com forragens cobrindo o solo no outono e inverno. Com base nesses números, é possível estimar uma área de pousio superior a 6 milhões de hectares nessa região, durante o inverno, quando não há plantas de cobertura ou cultura geradora de renda na propriedade.

No ambiente subtropical do Sul do Brasil, a falta de cobertura vegetal implica impactos diretos no solo, como a degradação através da erosão, compactação, redução da atividade microbiana e da fertilidade. Nos impactos indiretos do pousio, está a grande incidência de plantas daninhas que aumenta os custos de produção. Agora, os resultados da pesquisa mostram também os impactos do pousio na emissão de CO2 para a atmosfera.

Créditos de Carbono

O potencial de impacto das pesquisas com a fixação de carbono no sistema de produção de grãos tem reflexos tanto na esfera ambiental quanto na econômica. O mercado de compra e venda de créditos de carbono ainda está em regulamentação no mundo, mas a partir do Protocolo de Kyoto, firmado em 1997, a redução das emissões de gases do efeito estufa passou a ter valor econômico. Assim, quem reduz suas emissões pode vender esses créditos de carbono aos países que emitem mais gases.

Desde 2009, o Brasil conta com a Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009) que representa o compromisso do País junto às Nações Unidas para a redução de emissões de GEE. Diferentes empresas e instituições brasileiras já estão negociando créditos de carbono, no mercado voluntário de carbono, mesmo sem base jurídica definida.

De acordo com Santi, o Projeto de Lei 528/2021, que regulamenta o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões, estabelece 1 crédito de carbono igual a 1 tonelada de CO2. O valor hipotético é estimado em 10 dólares por crédito de carbono, ressaltando que ainda não há mercado consolidado no País, somente inferências sobre valores.

Conforme a proposta, os créditos de carbono deverão estar atrelados a projetos de redução ou remoção de gases de efeito estufa da atmosfera, sendo que esta redução (em toneladas) será convertida em títulos. Os títulos gerados serão objeto de negociação com governos, empresas ou pessoas físicas que têm metas obrigatórias para redução da emissão de gases de efeito estufa. Tais negociações serão definidas por leis e/ou tratados internacionais.

“Para entrar no mercado internacional de créditos de carbono, primeiramente precisamos da lei que regulamente este mercado no País, para então partirmos para a quantificação do balanço de CO2 nos sistemas de produção agropecuários nas mais diversas regiões produtivas, visando à geração dos créditos. Nesse contexto, a pesquisa assume papel fundamental para inserir o Brasil, de forma competitiva, no mercado de carbono”, conclui o pesquisador.

Saiba mais sobre Agricultura de baixa emissão de carbono no site da Embrapa. (Da Embrapa)

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