Criada em 07/11/2023 às 14h29 | Pesquisa

Extratos vegetais inibem atividade de vírus causador da Artrite Encefalite Caprina

Extratos vegetais obtidos a partir do nim e do cinamomo, duas plantas com potencial medicinal e inseticida, reduziram em até 1.000 vezes a presença do lentivírus no leite de cabra e em até 800 vezes no colostro.

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Extratos vegetais inibem atividade de vírus causador da Artrite Encefalite Caprina. (Foto: Divulgação)

Resultados indicam que os extratos vegetais estudados, como o Nim (foto acima), têm potencial para uso como compostos de antivirais, para aplicação em caprinos

Uma nova pesquisa mostra resultados promissores com o uso de extratos vegetais para inibição do vírus causador da artrite encefalite caprina (CAE), uma das doenças que mais impactam rebanhos dessa espécie. Testes realizados em laboratórios da Embrapa Caprinos e Ovinos (CE) e da Universidade Estadual do Ceará (Uece) com extratos obtidos a partir do nim (Azadirachta indica) e do cinamomo (Melia azedarach) mostraram redução de até 1.000 vezes na quantidade de partículas virais do lentivírus no leite de cabra e em até 800 vezes no colostro dos animais.

Esses resultados indicam que os extratos têm potencial para uso em novas etapas de testes no futuro, dessa vez como compostos na produção de medicamentos antivirais para aplicação nos caprinos. Caso esses medicamentos também apresentem bom desempenho, se tornarão alternativas biológicas para controle da CAE no leite e no colostro, que são uma das principais formas de transmissão do vírus para as crias de caprinos.

Os resultados da pesquisa foram publicados em artigo neste ano na revista científica Scientific Reports, da Nature. Uma das principais vantagens de um medicamento antiviral é ampliar o controle do lentivírus, além de torná-lo mais acessível a diversos produtores rurais que não têm estrutura ou acesso a equipamentos para realizarem processos como termização ou pasteurização do leite e colostro em suas propriedades.

Os testes para avaliação de uso dos extratos para inibição da atividade viral foram conduzidos pela bióloga Ana Lídia Sousa, em pesquisa para sua tese de doutorado em Ciências Veterinárias, pela Uece. Ela teve como coorientador do trabalho o pesquisador Rizaldo Pinheiro, da Embrapa Caprinos e Ovinos, e desenvolveu parte dos experimentos em laboratório da Empresa.

Sousa reforça que a intenção é produzir, no futuro, material que possa ser levado para a indústria farmacêutica e comercializado em larga escala, pois os processos existentes para inativação do vírus no leite e colostro (pasteurização e termização) não são universalmente acessíveis a produtores rurais brasileiros, especialmente os que têm dificuldade de acesso à energia elétrica, mão de obra qualificada ou a equipamentos.

“Por isso, temos essa vontade de produzir um medicamento antiviral que facilite a vida do produtor. Um produto já padronizado e comercializado, uma maneira mais fácil de inativar o vírus, sem que se precise de tanta mão de obra”, ressalta ela, que é professora da Faculdade de Educação da Ibiapaba (Faedi).

Pinheiro chama a atenção também para o fato de que a termização ou pasteurização podem causar problemas ao inativar imunoglobulinas importantes para a imunidade de cabritos ou cordeiros. “Além disso, são processos que exigem equipamento, tempo e, para buscar alternativas, pensamos em extratos vegetais para inativar esse vírus”, complementa.

Nos testes, o leite e o colostro, coletados de rebanho da Embrapa, foram infectados experimentalmente com o lentivírus caprino. Em seguida, as amostras foram submetidas aos extratos vegetais, na fase chamada de “cultivo”, no qual foi possível observar, ao longo de um processo de 63 dias, se havia atividade antiviral.

Os resultados confirmaram a hipótese dos pesquisadores, em testar extratos de vegetais que já haviam manifestado, em pesquisas, potencial de redução da atividade de outros vírus. “O interesse de usarmos esses extratos vegetais surgiu do fato de já terem apresentado ação antiviral com outros vírus como os da dengue, zika, gripe e até mesmo, em alguns estudos, com o HIV”, afirma Sousa.

Para Pinheiro, um aspecto importante dessa alternativa é buscar a inativação da atividade viral no leite e no colostro, que são os principais canais de transmissão. “Existem outras, por meio de contatos prolongados entre animais ou via sêmen, já que o vírus está presente em secreções e excreções. Mas essa é a principal via”, frisa o pesquisador.

Alternativas, como os chamados coquetéis antivirais utilizados na medicina humana para controle do HIV – que também é um tipo de lentivírus –, não são aceitas na Medicina Veterinária, especialmente para animais de produção porque podem deixar resíduos no leite de cabra, por exemplo.

Desafios para controle da CAE

A Artrite Encefalite Caprina é uma doença que ainda não tem cura, causando perdas produtivas e afetando a qualidade do leite. A sua disseminação em rebanhos brasileiros se constitui em um desafio para a pesquisa agropecuária brasileira, na busca de alternativas de controle.

Para a professora Fátima Teixeira, é um desafio lidar com uma doença que ainda não possui vacina ou tratamento disponível comercialmente, o que dificulta a aplicação da maioria das medidas recomendadas para controle de enfermidades transmissíveis. “O animal, após acometido, continuará nesse status até o final da vida e ainda sofrerá danos produtivos influenciando no decréscimo econômico da produtividade da espécie ovino-caprina”, frisa ela.

O controle da doença requer atenção a orientações de manejo sanitário para minimizar perdas produtivas. A busca por medicamentos para inibição da atividade viral surge como alternativa para que os rebanhos possam conviver com a CAE, reduzindo os impactos dos sintomas na produção e no quadro de saúde dos animais.

“Essa enfermidade, infelizmente, está disseminada pelo País. Inúmeros rebanhos caprinos leiteiros já têm o problema, existem perdas significativas de produção de leite, emagrecimento e isso compromete a produção. Com essas pesquisas, temos condição de minimizar essas perdas, reduzindo a carga viral, promovendo retardo no aparecimento dos sintomas clínicos e, consequentemente, o bem-estar animal, com maior produção”, acrescenta Pinheiro. (Da Embrapa)

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