Criada em 11/08/2022 às 10h01 | Pesquisa

Biofiltro reaproveita água doméstica para produção de alimentos e forragem

Por meio de um biofiltro, o sistema Bioágua Familiar reaproveita água doméstica usada em pias, chuveiros e lavanderias para produzir forragem e alimentos. Tecnologia realiza saneamento básico na zona rural, aumenta disponibilidade hídrica e atende a produtores familiares.

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Plantas irrigadas com água de reúso alcançaram quase o dobro de produção. (Foto: divulgação)

Amenizar os impactos das secas e da irregularidade das chuvas é um dos grandes desafios para a agricultura, especialmente para quem vive no Semiárido brasileiro. Uma alternativa para contornar o problema vem sendo testada pela Embrapa e utilizada na região. O sistema Bioágua Familiar Integrado reaproveita a água doméstica gerada nas pias, chuveiros e lavanderias – chamada de “águas cinzas” – para produzir alimentos e forragens (veja como funciona no quadro abaixo).

Um estudo realizado pela Embrapa Semiárido (PE), com plantio de palma forrageira, demonstrou que as plantas irrigadas com água de reúso alcançaram quase o dobro de produção, em comparação com o uso da água da companhia de abastecimento local. Isso porque, além de ser mais uma fonte hídrica, após passar pelo tratamento no biofiltro, a água também apresenta maior concentração de nutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio, essenciais para o desenvolvimento das plantas.

A pesquisadora Roseli Freire de Melo (foto à direita), responsável pelos estudos, explica que o sistema funciona como uma complementação hídrica, já que não é uma irrigação constante e que outras águas também podem ser utilizadas. “Mesmo sendo uma irrigação complementar, é possível notar nas plantações diferenças positivas no seu desenvolvimento, como folhas mais verdes, nutridas, e um suporte maior de forrageiras, uma vez que o tempo de espera entre um corte e outro é reduzido”, ressalta a pesquisadora.

Para ela, o reúso de águas cinzas surge como oportunidade de sustentabilidade de pequenos sistemas de produção. “Ele fortalece a produção familiar, realiza saneamento básico na zona rural, aumenta a disponibilidade hídrica e acaba transformando um problema em oportunidade, além dos benefícios ambientais”, destaca.

Sistema eficiente

Para avaliar a eficiência do uso das águas cinzas foi implantado, no Campo Experimental da Caatinga, da Embrapa Semiárido, um experimento com espécies forrageiras, como palma, leucena, gliricídia e moringa. Foram comparadas as plantas molhadas com água de reúso, com água da companhia de abastecimento e sem irrigação, com e sem uso de esterco.

Nesse sistema analisado, são gerados em torno de 1,5 mil litros de água por semana, correspondendo ao consumo aproximado de uma família com cinco pessoas, o suficiente para irrigar cerca de 1,26 mil plantas de palma forrageira.

Em sete meses de cultivo, cada planta de palma produziu uma média de 3,67 raquetes em condição de sequeiro (sem irrigação e sem esterco), e de 6,3 raquetes quando irrigada com água da companhia de abastecimento, com uso de esterco. Por outro lado, aquelas irrigadas com água de reúso e com esterco chegaram a uma média de 12,33 raquetes, correspondendo a quase o dobro da produção em relação à água não reutilizada. Considerando o custo médio de R$ 0,20 para venda da raquete, a estimativa de geração de renda para essa área é em torno de R$ 3,1 mil para o período analisado.

O pesquisador da Embrapa João Ricardo Ferreira de Lima, que conduziu o estudo de viabilidade econômica desse sistema, detalha que “com um investimento de implantação de aproximadamente R$ 6,5 mil, essa água, que antes seria descartada, pode ser tratada, armazenada e utilizada para irrigação, de forma a aumentar a produtividade das lavouras existentes e fazer o produtor economizar, a cada sete meses, cerca de R$ 3 mil com a compra de raquetes de palma para alimentação dos animais, ou obter uma receita desse mesmo montante, caso decida comercializar”.

Outro importante aspecto econômico do sistema é que ele ainda gera húmus de minhoca, que tanto pode ser utilizado diretamente na área do produtor como também, considerando a reprodução das minhocas colocadas no filtro, pode se transformar em outra fonte de renda. A estimativa é que, em um período de seis meses, o sistema consiga gerar cerca de 300 quilos de húmus. Um valor médio de R$ 5,50 por quilo significa a geração de R$ 1,65 mil a cada seis meses, em economia ou renda, no caso de comercialização.
Assim, de acordo com Lima, levando em conta o investimento inicial, custos de manutenção, entradas com o corte da palma e a retirada do húmus, todos os indicadores mostram a viabilidade econômica de se produzir palma irrigada utilizando o sistema de reúso de água. “Além de viável, o tempo de recuperação do investimento é bastante curto, próximo a um ano apenas”, ressalta.

Qualidade da água

As águas geradas no dia a dia nas residências, pela lavagem de louças e roupas, banhos e nas pias de banheiros, causam preocupação em relação à sua qualidade para o solo e para as plantas. Por essa razão, elas são tratadas no Bioágua, e sua utilização nesses sistemas vem sendo monitorada por meio de análises físicas e químicas realizadas no Laboratório Agroambiental da Embrapa Semiárido.

De acordo com Paula Tereza de Souza e Silva, a pesquisadora responsável, as avaliações comprovaram que, depois de ser tratada, a água possui qualidade suficiente para a irrigação, podendo ser aplicada tanto para culturas alimentares como forrageiras. “O que nós observamos é que o tratamento das águas cinzas é bastante promissor, pois remove uma quantidade significativa de matéria orgânica”, explica.

Para ela, um dos aspectos mais interessantes é que, na maioria das análises, é observada a presença de nitrogênio e fósforo em um teor significativo. “Isso é muito bom para a agricultura porque você já tem uma água enriquecida com esses nutrientes, que são essenciais para o desenvolvimento das plantas, e com isso aumenta a produção e reduz a necessidade de outra fonte de fertilizante”, avalia.

É importante ressaltar, no entanto, que as águas dos vasos sanitários não são aproveitadas nesse sistema. (Da Embrapa)

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