Criada em 30/05/2023 às 14h04 | Pesquisa

Alho-semente livre de vírus incrementou produtividade em até 150%

Até o fim da década de 1990, a produtividade nacional girava entre 4 e 8 toneladas por hectare e o alho produzido no Brasil era de baixa qualidade. O Brasil depende de alho importado desde os anos 1960.

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Livre de vírus, alho semente permitiu crescimento da produção e tranquilidade ao produtor. (Foto: Wenderson Araújo/CNA)

Desenvolvido por instituições brasileiras de pesquisa, o alho-semente livre de vírus mudou a produção da hortaliça no Brasil. A adoção da tecnologia levou a um incremento da cultura no País de até 150%, para algumas cultivares. Hoje, grandes produtores da região do Cerrado conseguem produzir até 25 toneladas por hectare (ha), bem distante das 8 toneladas produzidas no fim dos anos 1990. Na safra de 2021/22, a produção brasileira de alho foi de 220 mil toneladas, em uma área plantada de 16 mil hectares, e com rendimento médio de 13.750 kg/ha.

O caminho até o desenvolvimento da tecnologia foi longo. O programa de pesquisa da Embrapa em alho-semente livre de vírus já tem mais de 30 anos. De acordo com o pesquisador Francisco Vilela Resende, da Embrapa Hortaliças (DF), nos primeiros dez anos, a Empresa adotou a estratégia de concentrar o esforço em aprimorar o protocolo de limpeza, identificar as viroses, desenvolver os protocolos de indexação e avaliar como as plantas livres de vírus se comportariam no campo de produção comercial, estudando principalmente as curvas de reinfecção viral para estabelecer por quanto tempo seria possível usar o alho-semente sem perder a qualidade fitossanitária e fisiológica.

“A segunda parte se concentrou em levar a tecnologia para o agricultor e garantir a manutenção desse alho nas regiões produtoras, reduzindo a dependência da instituição geradora do material livre de vírus”, explica o pesquisador.

Tecnologia eficaz e acessível

A produção de alho-semente livre de vírus é uma tecnologia bastante acessível, adotada tanto por grandes quanto por pequenos produtores. A estimativa é que, pelo menos, 30% do aumento de produtividade na cadeia de produção de alho no Brasil seja devido à adoção dessa tecnologia pelos agricultores.

No caso dos pequenos produtores o impacto da tecnologia é ainda maior, pois historicamente eles sempre utilizaram alho-semente de baixa qualidade, de variedades bastante degeneradas e infectadas. Por isso, é comum observar a produtividade desses produtores dobrar com a adoção do alho-semente livre de vírus.

“Nas primeiras regiões em que nós começamos a trabalhar, os produtores conseguiam apenas 4 ou 6 toneladas por hectare. Com apenas dois anos de adoção do alho-semente livre de vírus, a produtividade passou para 10 a 12 toneladas por hectare. Isso sem inovar nenhum outro componente no sistema de produção”, relata o pesquisador.

É o caso de José Borges de Brito, conhecido como Valdez, produtor de alho-semente livre de vírus na região de Cristópolis (BA). Ele destaca que a tecnologia foi muito bem aceita na região por conta dos bons resultados e do aumento da rentabilidade das famílias. “Hoje eu tenho a minha renda e mantenho minha família tranquilo, sem precisar ir buscar um emprego lá fora. Essa é uma tecnologia que mantém a gente na roça”, assinala.

“Antes, a minha produtividade era de 3 a 3,5 toneladas por hectare usando o alho infectado sem nenhuma tecnologia, nenhum acompanhamento. Hoje, trabalhando com o alho-semente livre de vírus, estou produzindo de 15 a 16 toneladas por hectare. Foi um avanço muito grande,” comemora.

A tecnologia chegou à região de Cristópolis entre os anos de 2000 e 2003, por meio de um contrato assinado entre a Embrapa e a Secretaria Municipal de Agricultura. Foram instalados cinco telados para a realização de testes em campo, um deles na propriedade de Valdez, que permanece em atividade até hoje.

Atualmente, ele utiliza um telado de 140 metros quadrados, onde produz alho-semente para plantar meio hectare. “A produção desse meio hectare é o alho que eu vou passar para os outros produtores da região, o que dá para replantar de 7 a 8 hectares”, conta Valdez, comentando que, ao verem os bons resultados obtidos, seus vizinhos resolveram adotar a tecnologia também.

Divisor de águas

Para o presidente da Associação Nacional dos Produtores de Alho (Anapa), Rafael Corsino, o cultivo da semente livre de vírus foi um divisor de águas na produção brasileira de alho. “Graças a essa tecnologia, e com outros trabalhos de pesquisa, saímos de um patamar de 12 a 14 toneladas por hectare para algo em torno de 20 a 25 toneladas por hectare”, ressalta.

Segundo ele, com uma produtividade maior, “conseguimos ampliar a nossa presença no mercado nacional e estamos perto de atender a 70% da demanda interna. Produzimos mais e com mais qualidade. Temos bulbos maiores, com melhor aceitação comercial e remuneração no mercado”.

Corsino lembra que, recentemente, a Anapa uniu forças com a Embrapa para levar o alho livre de vírus aos agricultores familiares do Paraná e do Espírito Santo, para que os pequenos produtores também possam usufruir dos benefícios dessa tecnologia.

“A partir de uma articulação da Anapa com o Ministério da Agricultura (Mapa), foi possível a liberação de R$ 1 milhão para a Embrapa Hortaliças estimular o plantio de alho livre de vírus nesses locais”, comemora o presidente da Anapa, lembrando que esse investimento em pesquisa e na melhoria da produtividade contribui para a geração de empregos e renda para milhares de famílias no País.

Tecnologia já é de domínio público

A tecnologia de produção do alho-semente livre de vírus é de domínio público há alguns anos. Existem empresas privadas, grupos de agricultores e grandes agricultores que já contam com toda estrutura de produção, desde laboratórios à aclimatação, casas de vegetação, telados e campos de produção.

A base dessa tecnologia foi gerada não só pela Embrapa, mas também por universidades e outras instituições de pesquisa. A tecnologia também é usada em outros países, mas com protocolos ligeiramente diferenciados de acordo com a realidade de cada local e com o tipo de alho e cultivares utilizadas.

Transferência

Tanto a tecnologia para obtenção de material livre de vírus quanto a própria semente livre de vírus podem ser transferidas pela Embrapa para empresas e agricultores mediante contratos de cooperação técnica ou transferência de tecnologia.

“A capacidade de produção de alho-semente livre de vírus pela Embrapa é limitada, sendo possível apenas o atendimento de regiões de pequenos agricultores que plantam áreas de 1 a 2 hectares, em média. Não temos como fornecer alho-semente na quantidade que grandes produtores demandam, para plantar em até mais de 300 hectares, por exemplo”, explica Resende.

Entretanto, a Embrapa tem feito contratos de cooperação técnica para transferir a tecnologia de obtenção e de produção de alho-semente livre de vírus para atender a regiões de grandes produtores. (Da Embrapa)

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